Jurada passou mal e conselho de sentença foi dissolvido na última semana.
Inicialmente, 26 dos 79 acusados vão a júri pela morte de 15 detentos.
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Polícia Militar minutos antes da invasão do Carandirú. |
Após dois adiamentos, deve começar nesta segunda-feira (15), em São Paulo,
o primeiro dos quatro júris do massacre do Carandiru. Deverão ser
julgados 26 dos 79 policiais militares acusados de participarem da
invasão à Casa de Detenção, em 2 de outubro de 1992, para conter a
rebelião de presos. Cento e onze detentos foram mortos. Os réus que vão a
júri respondem em liberdade pela morte de 15 deles no1º andar do
Pavilhão 9.
A previsão é que o julgamento comece às 9h no Fórum da Barra Funda,
Zona Oeste da capital. A sentença deverá ser conhecida em até duas
semanas por causa da quantidade de réus e testemunhas.
O júri tinha sido adiado em janeiro, por causa de um pedido da defesa
para saber se a Polícia Técnico-Científica conseguiria, duas décadas
após as mortes, fazer uma perícia de confronto balístico nas armas
apreendidas com os PMs e nos projéteis retirados dos corpos das vítimas.
A resposta foi negativa. O adiamento mais recente ocorreu na
segunda-feira passada, quando uma jurada passou mal e obrigou o juiz a
marcar outra data.
Nesta segunda, outros sete jurados serão sorteados e vão começar a
decidir se os policiais são culpados ou inocentes do crime de homicídio
doloso qualificado (quando há intenção de matar, sem dar chance de a
vítima se defender) contra cada um dos detentos. Para o Ministério
Público, responsável pela acusação, os PMs executaram as vítimas e, por
esse motivo, deveriam ser condenados à prisão pelas mortes que
provocaram.
Os defensores dos acusados, por sua vez, rebatem a denúncia da
Promotoria alegando que os policiais agiram no cumprimento do dever para
por fim ao tumulto na cadeia. Para os advogados, eles só dispararam
contra os presos em legítima defesa porque eram ameaçados e agredidos
por eles. O juiz José Augusto Nardy Marzagão preside o júri.
Desde 1992 até agora, somente um réu foi julgado no processo do
massacre: o coronel Ubiratan Guimarães. Em 2001, o então comandante do
Policiamento Metropolitano e responsável pela invasão ao presídio foi
condenado a 632 anos de prisão pelo assassinato dos 111 detentos. Cinco
anos depois, no entanto, sua defesa recorreu da sentença e ele, já na
condição de deputado estadual, foi absolvido. O oficial e político foi
morto com um tiro em 2006, dentro de seu apartamento.
Júri desmembrado
Mais 53 PMs serão julgados posteriormente pelas mortes dos demais 96
detentos. No total, 79 são acusados no mesmo processo do Carandiru. São
57 volumes, 111 apensos e 50 mil páginas. Por conta do número de réus,
no entanto, a Justiça desmembrou o caso em quatro partes ou júris
diferentes, correspondentes aos andares invadidos. O critério será
julgar o grupo de policiais militares que esteve em cada um dos
pavimentos onde presos foram mortos.
No térreo do Pavilhão 9 não houve mortes. No segundo andar, porém,
outros 29 PMs da Rota entraram e deixaram 73 vítimas. No terceiro andar
ingressaram 16 integrantes do Comando de Operações Especiais (COE) e
saíram de lá oito presos sem vida. Mais 15 homens foram mortos no quarto
andar após a ida de 13 membros do Grupo de Ações Táticas Especiais
(Gate).
Entre um julgamento e outro está programado um intervalo de até três
meses, segundo o juiz do caso, José Augusto Marzagão, informou a
assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça de São Paulo. O
magistrado pretende terminar todos os julgamentos neste ano.
Rota
Nesta primeira etapa vão a julgamento 26 então policiais das Rondas
Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) que invadiram o 1º andar da unidade
prisional e participaram da ação que resultou em 15 detentos mortos.
Desse total, 14 deles foram baleados e um esfaqueado. Atualmente,
somente oito dos réus continuam na ativa, e após promoções estão
trabalhando na PM como oficiais. Os demais se aposentaram. Pela lei, os
acusados não são obrigados a comparecer ao julgamento. Pelo menos dois
deles não deverão ir por motivos de doença.
Presos mortos no 1º andar (2º pavimento) |
Nome |
Quantos tiros levou |
Jovemar Paulo Alves Ribeiro |
1 |
José Alberto Gomes Pessoa |
3 |
José Bento da Silva Neto |
3 |
Rogério Piassa |
3 |
Luiz Granja da Silva Neto |
4 |
Olívio Antonio Luiz Filho |
4 |
Paulo Reis Antunes |
4 |
João dos Santos |
4 |
Ailton Júlio de Oliveira |
5 |
Roberto Alves Vieira |
6 |
Ronaldo Aparecido Gasparino |
7 |
Almir Jean Soares |
7 |
Mauro Batista Silva |
7 |
Cláudio José de Carvalho |
8 |
José Pereira da Silva |
0 (teve 10 ferimentos
por arma branca) |
Para a Promotoria, o maior desafio da acusação será o de convencer os
jurados de que é errada a ideia de que "bandido bom é bandido morto".
"Infelizmente, tem muita gente que coaduna com essa ideia. Tanto que
alguns policiais, ao invés de punidos, são premiados", comentou o
promotor Márcio Friggi.
Para tentar convencer os jurados de que os PMs devem ser punidos por
executarem os presos, os promotores querem ouvir os depoimentos de
testemunhas que presenciaram o massacre, entre elas detentos
sobreviventes. Também foram arrolados um agente penitenciário que
trabalhava no Carandiru e o perito que esteve na cena do crime.
Argumentar sobre o risco da impunidade é outra estratégia da acusação. A
Promotoria poderá citar, por exemplo, que a morte dos detentos provocou
o surgimento de uma das facções criminosas mais perigosas de São Paulo.
Os defensores dos acusados rebatem a denúncia do Ministério Público.
Alegam que os policiais agiram no cumprimento do dever para por fim ao
tumulto na cadeia e que só dispararam em legítima defesa porque eram
ameaçados e agredidos por eles. Além do total de presos mortos no
Carandiru, 87 detentos ficaram feridos. Nenhum dos PMs foi morto ou
ferido a bala naquele dia, mas 23 policiais também se machucaram.
Quem são os PMs acusados |
Nome |
Patente (na época) |
Ronaldo Ribeiro dos Santos |
Comandante e
capitão da Rota |
Aércio Dornelas Santos |
Tenente |
Eduardo Espósito |
Tenente |
Maurício Marchese Rodrigues |
Tenente |
Wlandekis Antonio Candido Silva |
Sargento |
Roberto Alberto da Silva |
Sargento |
Antonio Luiz Aparecido Marangoni |
Sargento |
Joel Cantilio Dias |
Sargento |
Pedro Paulo de Oliveira Marques |
Sargento |
Gervásio Pereira dos Santos Filho |
Sargento |
Marcos Antonio de Medeiros |
Sargento |
Paulo Estevão de Melo |
Cabo |
Haroldo Wilson de Mello |
Cabo |
Roberto Yoshio Yoshikado |
Cabo |
Salvador Sarnelli |
Cabo |
Fernando Trindade |
Soldado |
Argemiro Cândido |
Soldado |
Elder Tarabori |
Soldado |
Antonio Mauro Scarpa |
Soldado |
Marcelo José de Lira |
Soldado |
Roberto do Carmo Filho |
Soldado |
Zaqueu Teixeira |
Soldado |
Osvaldo Papa |
Soldado |
Reinaldo Henrique de Oliveira |
Soldado |
Sidnei Serafim dos Anjos |
Soldado |
Marcos Ricardo Poloniato |
Soldado |
“Não há o que se falar em assassinato e execução. Não houve massacre.
Meus clientes agiram de acordo com a lei e responderam quando foram
atacados pelos detentos”, afirmou a advogada Ieda de Souza, que pedirá
aos jurados a absolvição de todos os réus.
Segundo a defensora dos PMs, um dos argumentos da defesa será o fato de
não existir até agora nenhuma prova técnica que indique qual policial
matou um determinado preso. “O grande problema da acusação será
conseguir individualizar a conduta de cada PM”, afirmou. “A própria
Polícia Técnico-Científica informou recentemente que nunca realizou a
perícia do confronto balístico, entre as 388 armas apreendidas dos PMs e
as balas encontradas nos corpos dos presos, por que nunca houve
condições técnicas para se realizar isso”, afirmou Ieda.
Entre as testemunhas solicitadas pela defesa dos PMs estão Luiz Antonio
Fleury Filho, então governador de São Paulo à época; Pedro Franco
Campos, que foi secretário da Segurança Pública do estado, além de
agentes penitenciários.
As testemunhas ficarão isoladas entre si e do público durante o júri e
só serão liberadas após prestarem depoimento. Elas dormirão no Fórum de
Santana, na Zona Norte. Os jurados, porém, só voltarão para suas
residências após o julgamento. Durante esse tempo, descansarão no Fórum
da Barra Funda. De acordo com o TJ, R$ 8 mil serão gastos só com a
alimentação.
As 350 cadeiras do plenário dez deverão acomodar parentes das vítimas e
dos acusados, jornalistas e o público que quiser assistir ao júri.